Espaço de discussão e reflexão sobre a MEMÓRIA/TEMPO na construção do espetáculo de dança contemporânea "INPUT" da desCompanhia de dança. O projeto foi contemplado pelo Edital de Dança de Produção da Fundação Cultural de Curitiba e será estreado no dia 05 de Junho de 2014 no Teatro Kraide do Portão Cultural em Curitiba. Para maiores informações sobre a cia favor acessar o nosso blog www.descompanhia.blogspot.com

domingo, 30 de março de 2014

Sabedoria do corpo

des, nos laboratórios de criação junto ao Tuca Pinheiro e a Cintia Napoli, algumas frases/ideias ficaram marcantes para mim. Compartilho algumas delas no nosso díario de bordo:

  • Se racionalizar demais é como se estiver menosprezando o corpo, o que já é, o que já existe e sabe.
  • O sujeito da ação é a ação.
  • O corpo existe no coletivo.
  • O corpo imagético não é privado, é um corpo público.
  • Como transformar a imagem em potência pública? O público entra na imagem construída e cada um leva o que fica dela.
  • Falar da memória para resgatar os sentidos das coisas.
  • Memória não é somente uma lembrança, ela é uma forma de ver e interagir com o mundo.
  • Padrão não é ruim, ele precisa ser um dispositivo par avançar/evoluir.
  • Como acessar as memórias das pessoas sem precisar saber dos fatos pessoais?
  • Padrão talvez seja uma memória calcificada.
  • Como transformar o que está em cena em memória do público?
  • A questão da memória é muito ampla, não conseguimos dar conta de tudo, então precisamos partir desse ponto.
  • O que do individual se torna coletivo? Talvez podemos ir para o corpo como corpo.
  • O que não está no corpo vira pastiche.
  • Memória é quando faz alguma coisa com a história. Dessa maneira, memória não é simplesmente uma história. Fazemos algo com a memória, ela fica em algum lugar do corpo.

Deixo recortado um trecho que encontrei de um livro sobre Nietzsche que o prof. de filosofia Tulio Tibério da UNICENTRO-Irati me indicou. No final da postagem, a quem se interessar, deixo o tema “Sabedoria do corpo” do Capítulo IV do livro na integra. É uma leitura curta, rápida e gostosa ;) Yiuki Doi

“Partindo da consciência, formas-se uma representação superficial e aberrante da vida psíquica, cai-se vítima da falsa separação entre a alma e o corpo, é-se irresistivelmente atraído para o Idealismo e fascinado pelas miragens da metafísica. Pretende-se, ao menos uma vez, ter os meios de uma interpretação adequada da realidade, não ter nenhuma hesitação: é preciso, afirma Nietzsche, deixar de conceber crédito à consciência e se voltar para o corpo. Pois é o corpo o único que tem condições de nos instruir sobre o valor de nossa personalidade profunda. Colocarmo-nos, para decifrar o mundo, no ponto de vista do corpo […] é preciso admitir que esse pensamento corporal, inconsciente, com toda a sua gama de operações delicadas como julgar, imaginar, criar valores, é muito mais aperfeiçoado e sutil do que o pensamento consciente associado ao eu e ao intelecto: “A esplêndida coesão dos mais múltiplos seres vivos, o modo como as atividades superiores e inferiores se ajustam e se integram entre si, essa obediência multiforme, não-cega, e menos ainda mecânica, mas crítica, prudente, cuidadosa ou mesmo rebelde – todo esse fenômeno do ‘corpo’ é, do ponto de vista intelectual, tão superior à nossa consciência, ao nosso ‘espírito’, aos nossos modos conscientes de pensar, do sentir e de querer”

Nietzsche - Sabedoria do corpo
por Jean Granier

 


Nietzsche - Sabedoria do corpo

por Jean Granier

Partindo da consciência, formas-se uma representação superficial e aberrante da vida psíquica, cai-se vítima da falsa separação entre a alma e o corpo, é-se irresistivelmente atraído para o Idealismo e fascinado pelas miragens da metafísica. Pretende-se, ao menos uma vez, ter os meios de uma interpretação adequada da realidade, não ter nenhuma hesitação: é preciso, afirma Nietzsche, deixar de conceber crédito à consciência e se voltar para o corpo. Pois é o corpo o único que tem condições de nos instruir sobre o valor de nossa personalidade profunda. Colocarmo-nos, para decifrar o mundo, no ponto de vista do corpo: é esta a desconcertante, mas fecunda “Revolução copernicana” que Nietzsche nos sugere, e que, em comparação à célebre Revolução kantiana, substituirá o cogito transcendental (e, aliás, todo cogito garantido pela consciência de si) pela compreensão viva que define a subjetividade corporal. Trata-se, com efeito, de um corpo em que a consciência é uma simples função entre outras, e cuja atividade já é desde sempre, por si mesma, manifestação de uma subjetividade, em outros termos, produção intencional de significações. Assim Nietzsche escolhe falar do corpo como um “Si” (das Selbst) e lhe dar magnitude como “a grande razão”: “O corpo é uma grande razão, uma multidão unânime, um estado de pás e de guerra, um rebanho e seu pastor. Esta pequena razão que dizes ser seu espírito, é meu irmão, é apenas um instrumento de seu corpo, e um pequenino instrumento, um joguete de tua grande razão” (Assim falou Zaratustra). A partir disso já não é um escândalo (exceto para um incondicional guardião de cogito!) atribuir o pensamento ao próprio corpo: “Admite-se aqui”, declara Nietzsche com tranquila segurança, “que todo organismo pensa, que todas as formações orgânicas participam do pensar, do sentir, do querer e por conseguinte, que o cérebro é somente um enorme aparelho de concentração” (Fragmentos sobre a energia e a potência). O dualismo da res cogitans e da res extensa é derrubado por fórmulas deste gênero: “Por toda parte onde vemos ou adivinhamos um movimento no corpo, é preciso concluir que há uma vida invisível e subjetiva ligado a ele” (Vontade e potência I).

Melhor: é preciso admitir que esse pensamento corporal, inconsciente, com toda a sua gama de operações delicadas como julgar, imaginar, criar valores, é muito mais aperfeiçoado e sutil do que o pensamento consciente associado ao eu e ao intelecto: “A esplêndida coesão dos mais múltiplos seres vivos, o modo como as atividades superiores e inferiores se ajustam e se integram entre si, essa obediência multiforme, não-cega, e menos ainda mecânica, mas crítica, prudente, cuidadosa ou mesmo rebelde – todo esse fenômeno do ‘corpo’ é, do ponto de vista intelectual, tão superior à nossa consciência, ao nosso ‘espírito’, aos nossos modos conscientes de pensar, do sentir e de querer, quanto a álgebra é superior à tabuada” (Vontade de potência I). Não é difícil de convencer disso, desde que se cuide de reinserir a consciência no contexto da vida e do mundo real, ao invés de se hipnotizar pela evidência pontual do cogito. Então revela-se claramente que as intermitências da consciência de si e os grosseiros erros que ela comete, tanto em suas avaliações do mundo exterior quanto em sua representação do corpo, tornariam impossível o desenvolvimento dos organismos, caso o corpo já não assegurasse continuamente a solução dos problemas fundamentais. De modo que o intelecto e, de modo geral, as faculdades do espírito consciente são chamados a intervir apenas ocasionalmente, obedecendo a comandos transmitidos pelo próprio corpo (Vontade de potência I).

Mas essa própria subjetividade global do corpo é reunião de multidão de subjetividades solidárias entre si, segundo estruturas de hierarquização muito complexas e em constantes mutação, pois aqui, como alhures, a harmonia só pode derivar de uma luta. “Guiamos por esse fio condutor do corpo [...] aprendemos que nossa vida só é possível graças ao jogo combinado de várias inteligências de valor muito desigual, graças, portanto, a uma perpétua troca de obediência e comando sob inumeráveis formas” (Vontade de potência I).

Cada uma dessas subjetividades orgânicas corresponde ao que captamos, mas apenas por meio da representação mais ou menos aproximada de nossa consciência, como “instintos”. Esses instintos são pulsões investidas de um certo quantum de energia vital e cujo trabalho, realizado nas profundezas de Si corporal, mantém-se oculto à observação consciente: as aptidões de cada personalidade e a determinação do seu destino dependem do vigor desses instintos e da qualidade de seu discernimento. Em decorrência disso, “o gênio reside no instinto, a bondade também. O único ato perfeito é o ato instintivo” (Vontade de potência I). O corolário dessa proposições fundamental dá a chave da decadência: decadente é a personalidade cujos instintos estão debilitados e ser tornaram anárquicos, por falha do sistema regulador que garante a unidade do Si, de modo que ela é obrigado a se apoiar em sua consciência e em sua razão, forjando para si, com a disciplina ascética da Moral, um lastimável sucedâneo da flexível inteligência adaptativa dos instintos. O decadente é o doente do instinto, que tenta compensar sua carências com uma hipertrofia da lógica e da consciência do puro Dever.

Coleção L&P Pocket, vol. 823 (Nietzsche – por Jean Granier)
Tema “Sabedoria do corpo” do Capítulo IV, pag 89
1ª Edição Setembro de 2009


Ficha Técnica

  • Argumento: desCompanhia de dança
  • Direção: Cintia Napoli
  • Concepção e Dramaturgia: Tuca Pinheiro
  • Assistente de Direção: Juliana Adur
  • Criação e Performance: Juliana Adur, Marina Mello, Peter Abudi e Yiuki Doi
  • Iluminação e operação de luz: Fernando Dourado
  • Trilha sonora: Tuca Pinheiro
  • Operação de som: Cindy Napoli
  • Frigurino: Eduardo Giacomini
  • Paisagem sonora externa: Edith de Camargo
  • Voz em off: Paolla de Andrade Torrilhas
  • Texto criado por: Juliana Adur, Marina Mello, Peter Abudi e Yiuki Doi
  • Assessoria de Imprensa: Fernando Proença
  • Ilustração: L. P. Daniel
  • Comunicação Visual: Maria Baptista
  • Direção de produção: Cindy Napoli

Sobre a obra

Este projeto da desCompanhia de dança tem o tempo como questão, numa abordagem na qual a memória surge como um elemento provocador para a construção dramatúrgica do trabalho. Como o passado determina e/ou se relaciona com o presente e com o porvir? Como passado, presente e futuro atravessam o corpo do bailarino? E, ainda, de que maneira é possível tecer temporalidades cênicas que transgridam a noção cronológica de tempo do artista e do espectador? Para Proust, cada vez que rememoramos um fato ou uma situação vivida, perdemos um novo pedaço desta memória. Quanto mais a tentamos capturar, mais a perdemos. Qual é a diferença entre memória e lembrança? E o que dizer das memórias do corpo? Onde ficam guardadas e como são resgatadas?

Estas são algumas das perguntas que temos interesse em vasculhar e mover através da nossa dança e convidamos o bailarino, coreógrafo e pesquisador Tuca Pinheiro, de Belo Horizonte – Minas Gerais, para nos auxiliar nesta tarefa. Pela primeira vez a companhia investe em uma estrutura de direção compartilhada, que vem de encontro com as nossas necessidades atuais de experimentar novos formatos de pesquisa. Queremos ser provocados por um novo olhar - um olhar que, por estar distanciado do trabalho diário da companhia, possa nos revelar outros ângulos sobre a criação artística em dança e outros possíveis entendimentos relativos ao movimento. Tuca surge então neste projeto como um provocador, ensaiador e colaborador dramatúrgico.

Objetivamos ainda trabalhar na sensibilização e formação de plateia, tanto através das contrapartidas sociais (quando a formação de plateia acontece de uma maneira mais direta e direcionada) quanto através das apresentações abertas ao público espontâneo, tendo em vista que o acesso ao espetáculo e às contrapartidas sociais será gratuito. Além disso, acreditamos que o tema proposto e a maneira como pretendemos abordá-lo potencializam esse trabalho de sensibilização da plateia por tratarmos de questões inerentes a todos nós, artistas ou não. Queremos, portanto, construir um espaço democrático de experiência estética, onde as questões particulares dos bailarinos possam comunicar-se com os espectadores e gerar neles novas questões e reflexões.

Esse projeto surge, portanto, da necessidade conjunta dos integrantes da desCompanhia de renovação constante nas suas configurações de trabalho, a fim de alcançar resultados artísticos que, a partir da crença no potencial transformador da arte, fortaleçam o diálogo da dança com a sociedade e que se mantenham conectados com o que se pensa e se produz em dança na atualidade.

Equipe desCompanhia

sábado, 29 de março de 2014

MEMÓRIA DA PELE - A relação harmônica entre a energia yang e ying.

des,

Há anos atrás fiz algumas aulas de Nei-Kung, uma arte marcial com influência da cultura tibetana, uma das teorias interessantes desta filosofia é que existem polaridades entre parte anterior e posterior do corpo. A parte anterior é positiva e a posterior é negativa. Também lendo o livro “O Corpo Tem suas Razões – Antiginásticas e consciência de si” da autora Thérèse Bertherat, eu encontrei um trecho que diz que os meridianos posteriores, na medicina chinesa, possui relação com a energia yang (negativo), e que os meridianos da parte frontal possui relação com a energia ying (positivo). O que essas informações ajudariam na minha dança? Parece maluquice, mas contribuiu para clarear da onde vêm alguns dos meus padrões de movimentos. Padrões que foi identificado pelo Tuca Pinheiro e Cintia Napoli que apontavam certa falta de organização, foco e clareza. Para os que não conhecem conceitos taoistas de energia, o yang é a energia ativa, solar e masculina; em contrapartida, a ying é receptiva, lunar e feminina (vale lembrar que estas são explicações simplificadas). Descobri que tenho desequilíbrio em ativar a pele posterior do meu corpo, que tem haver com a energia yang (masculina). Da onde vem isso? Eu consigo lembrar coisas da infância que me marcaram, mas não cabe expor aqui, nem preciso ;) Mas o legal dessa história toda é descobrir que posso reequilibrar as duas polaridades da minha pele. Ando experimentando isso no quotidiano e notei que melhorou o meu alinhamento corporal: meu joelho se sente aliviado e consegui levantar o arco transversal da sola do meu pé :) Compartilho isso, pois no laboratório de criação, tenho me interessado nas marcas do corpo e as qualidades distintas que estas podem me provocar. Utilizar essas marcas signfica para mim atualizar, modificar e criar novas consciências de movimentos.

Yiuki

a Dança não tem importância...

galera me peguei pensando na frase que o Gustavo falou pra Cintia e a Cintia falou pra gente.... e ai me aparece esse vídeo nos olhos, e tento ainda mais responder
qual é o corpo do trabalho?
qual o movimento que eu busco da minha memória?

mover/mexer todos somos capazes.


fica ai meu vídeo (pensante) de sábado....

http://www.ideafixa.com/musica-e-contexto/

sexta-feira, 28 de março de 2014

o que quero falar da memória.

Quero começar pelo fascínio que a memória me traz, como é bom poder contar, lembrar e reviver alguns fatos da vida. Porque sempre que busco a memória me vem coisas boas, histórias que me fazem bem?
A minha memória funciona assim, volto ao lugar, sinto os cheiros e me vem logo as cores e os movimentos da história/memória que quero tratar. É curioso que sempre alguns fatos aumentam ou diminuem a cada contação, depende a empolgação que coloco no momento.

Parei para pensar e tudo me sai do pensamento, seria a falta de memórias ou uma busca muito intensa por um fato que quero nesse momento?

Tenho que me acalmar para ver a memória surgir, mansa como uma nascente de rio e é bem assim, quando menos percebo ela é um rio  imenso, navegável em minha frente.

rio_ perigo, medo, bonito, grande, misterioso (não se sabe o que ele tem no fundo) enganador, inconstante, sujeito sempre a alterações.

                                                                                     PAREI.



IMPRESSÕES DO ENSAIO DE 13/MARÇO/2014.                                              por Peter Abudi.


impressões do último ensaio

Iniciamos com a longa tragetória para sair do chão em “uníssono”. Como encontrar um corpo para o trabalho sem perder as especificidades de cada um?
Depois começamos a integrar o movimento do outro, agregando novas memórias ao nosso movimento. Na 1ª etapa tive a nítida sensação de continuar o discurso do outro, como no nosso exercício verbal. Cheguei até a me confundir com o Yiuki e a me esquecer do que eu tinha construído sozinha anteriormente. Como se estivesse o tempo todo mentindo. Dançando uma dança que não era minha, mas que também era.
No 2º momento, pensar em uma palavra: ACÚMULO.
“Meu corpo acumula todos os passados do mundo”.
Aí, pensamos em construir sobre essa palavra. Ora me perco no caos das infinitas possibilidades, ora encontro lugares que me interessam. Quais? AQUELES EM QUE ME PERCO NO OUTRO E AQUELES QUE ME TOCAM PESSOALMENTE. O entre é todo o resto. Um universo. Pode ser tudo e também pode não ser absolutamente nada. A quem pode interessar? Meu corpo memória exposto? Uma grande exposição de corpos diluídos no tempo-espaço da memória. Crises …

'O que o corpo não lembra'


pesquisando umas coisas encontrei o espetáculo "What the Body Does Not Remember" do grupo belga Ultima Vez, e achei que poderia ser legal compartilhá-lo com vocês. O trabalho, de 1987, foi a estreia do grupo dirigido pelo coreógrafo Wim Vandekeybus. Em 2013 fizeram uma remontagem, que inclusive veio para a Bienal de Dança do Sesc do ano passado. 
Não consegui encontrar o vídeo inteiro, apenas um pequeno fragmento. E pela descrição do trabalho no site, acho que mesmo o ponto de partida dele foi bem diferente do nosso - não exatamente a memória, mas mais as relações entre atração e repulsa, agressividade, medo, ansiedade. 
Mas achei interessante compartilhar mesmo assim. Há também um texto interessante do Wim Vandekeybus na página deste trabalho no site da companhia, especialmente a seguinte frase: "Mais quand tout est dit et fait, le corps ne se souvient peut-être de rien et tout est une illusion subtile du manque, ce qui aide à jalonner le jeu ou à l’épuiser" e que eu, no meu atual nível de francês, poderia traduzir como: "Mas quando tudo está dito e feito, talvez o corpo não se lembre de nada e tudo seja uma ilusão sutil de falta, que ajuda a balizar o jogo ou a esgotá-lo". 


Aí vai o link do vídeo que encontrei, como um pequeno teaser da versão 2013:




Aqui está o link da página deste trabalho no site da companhia (aonde se pode encontrar mais informações sobre o trabalho e o texto completo [um parágrafo] daonde tirei a frase dali de cima):  http://www.ultimavez.com/fr/productions/what-body-does-not-remember

E, para finalizar, um texto da Clarice Lima sobre esse trabalho, dentro do projeto 7x7 (um projeto de manifestações crítico-poéticas em torno de trabalhos artísticos escritos por artistas - como uma espécie de feedback poético espontâneo). Apesar dela colocar questões muito pessoais nesse texto de alguma forma, pelo menos para mim, ele redimensiona coisas. E isso me fez pensar em duas questões; uma que é: eu leio o texto dela mas não tive acesso ao trabalho que ela assistiu (que poderíamos chamar de 'o fato'), no entanto, ele acaba criando um sentido para mim independentemente deste fato específico (o espetáculo) e quase uma mem´ria-invenção do trabalho (como se eu criasse um espetáculo a partir das impressões e memórias dela em confronto com o quê isso vai reverberando nas minhas próprias memórias); a segunda: ele cria sentido para mim a partir de outros fatos bastante específicos (suas próprias memórias e o modo como me relaciono com isso que ela escreve), mas de algum jeito apesar dessas especifidades eles me afetam - o que me leva à pergunta: qual o limiar entre o particular e particular-universalizado? 


Drink no Dancing
Por Clarice Lima a partir de O que o corpo não lembra, de Wim Vandekeybus
O corpo lembra que amo dançar, que perco 1 kilo por espetáculo, que faço aula de balé antes de jogar tijolos pro ar, que no meu suor tem muito redbull e relaxante muscular, que me sinto cansada a maior parte do tempo, que tenho espetáculo agendados até 2015, que isso é tudo que eu sempre quis, que não vou operar meu joelho, que na audição tinham 500 bailarinos, que sou ok, que tenho sorte e coragem, que fico constrangida com aplausos no meio do espetáculo, que não consigo parar de roer as unhas, que sou Eslovaca, que tenho 22 anos, que já engordei, emagreci, engordei, emagreci e comecei a fumar, que não trabalho com sedução, que é emocionante dançar em grupo, que mal vejo o meu marido, que dançar dói, que como mais stroopwafel do que deveria, que vivo ilegalmente na Europa, que I forgive but I don’t forget, que não sou coreógrafa, que li Roger Garaudy, que tenho muita energia masculina, que gosto de romance, cinema, drink no dancing,cheese.
O que o corpo não lembra é que isso foi há 25 anos atrás.
lá tem também mais informações sobre o 7x7 se alguém se interessar)


Acho que é isso, por hora. Desculpem se  meu último parágrafo ficou meio confuso. Podemos conversar melhor sobre, se for o caso.

Beijos!

quinta-feira, 27 de março de 2014

Memória do Músculo

“Toda rigidez muscular contém história e a significação da sua origem. Quando ela é dissolvida, não só a energia é liberada… mas também traz a memória da própria situação infantil em que o recalque se deu” (Wilhelm Reich)

des, semana passada li o livro “O Corpo Tem suas Razões – Antiginásticas e consciência de si” da autora Thérèse Bertherat indicado pela dupla Gisele Onuki & Cinthia Andrade na disciplina Abordagens e Análise da Dança no 1º ano da FAP. Esse livro me ajudou a revisitar várias memórias do meu corpo. Nessas recordações, percebi que muitos deles ficaram registrados nos meus músculos: padrões de posturas, tensões musculares, padrões de movimentos, etc.

No nosso laboratório, a memória do músculo ajudou a acionar sensações que disparam o meu movimento. Sinto que as lembranças particulares, que advém junto ao meu dançar, estão conectados a esses acessos musculares - mas que essas histórias particulares podem ficar guardadas para mim. Interessa-me compartilhar com o público os movimentos oriundos dessas marcas que ficaram no meu corpo.

Dessa maneira, desapego/liberto das minhas lembranças particulares, mas apego-me a capacidade de memorizar do meu corpo, essa que pode ser atualizada, modificada, expandida, exagerada, minimizada e recriada durante os laboratórios de criação. Nesse processo, gostaria até de mimetizar os movimentos dos outros, as marcas dos outros, a fim de transformá-los em minhas memórias musculares e particulares.

Yiuki

quarta-feira, 26 de março de 2014

O que eu gostaria de falar sobre a memória

Eu tenho vontade de falar sobre a nossa capacidade de recriar constantemente a memória. Me interessa muito o lugar onde a realidade e a ficção se misturam. A Fricção. Talvez dançar uma mentira. Talvez contar a história de alguém como se fosse minha. Ou dançar a dança de alguém como se fosse minha. Eu gosto do paradoxo da memória. Dos limites tênus entre imagem e imaginação.
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Também me interesso pela perda ou dificuldade de reter a memória. Aquilo que escapa (e portanto não possuo?) ou aquilo que meu corpo de recusa a registrar. Lapsos. Buracos negros. Corpo sem memória? Se eu fosse usar uma memória mais pessoal para este trabalho, acho que usaria minha sempre incompleta memória sobre o acidente do meu pai.
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Também gostos da ideia do que não se resolve nunca, como no livro Leite Derramado, do Chico Buarque. Sobreposições de memórias que nunca darão conta de revelar aquilo que realmente aconteceu. Armadilhas da mente.
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Impregnar o espaço de memórias. Lidar com o TEMPO a fim de construir uma memória material para o público. Acumulação de passados.
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Dramaturgicamente não tentar resolver aquilo que não pode ser resolvido.

pequeno inventário da Boina Vermelha

Palavras-chave:
  • bolsa
  • máscara (rosto vermelho)
  • leque
  • coração
  • peito
Experimentos:
  1. Criar movimentos com a boina como protagonista. Talvez pensar nos verbos utilitários encontrados para ela: aquecer, prender, esconder, …
  2. Produzir um vídeo com a boina em local público.
  3. Descobrir algo que possa ser revelado de dentro da boina, como um “coelho da cartola”.
  4. Criar uma nova memória para a boina no corpo, até que ela possa desaparecer. Redimensionar o objeto e seus significados. Impregnar. O que fica? Um rastro vermelho.
  5. Brincar com uma música que surgiu ao acaso: How deep is your love

terça-feira, 25 de março de 2014

Memórias de processo com Tuca Pinheiro

Corpo em X. Desconforto nas articulações coxo-femurais. Partes protagonistas do corpo. Criação de novas memórias para o corpo. Descoberta de novas tragetórias. Não fixar em nenhuma forma. Abrir frestas para o desconhecido. Rituais africanos de candomblé. Colunas de mulheres negras. Inconsciente coletivo. Memória coletiva. Memória nacional. O que seria um corpo sem memória? Virei uma ameba. Alívio e pavor ao mesmo tempo. Paradoxo. Tempo. Discussões sobre o tempo do trabalho. Existe o tempo dos materiais, o tempo da cena e o tempo da obra. Estou no caos. Começamos o processo às avessas do que geralmente fazíamos, do coletivo para o individual. Sentimento bom. Qual é o corpo deste trabalho? O mais importante é o estado encontrado, não as formas. Parece uma dança em uníssono. Como resgatar estes estados? O espaço vai ficando impregnado da memória do movimento. A importância da permanência e da insistência. É preciso que a máscara esteja integrada ao tônus do resto do corpo. Estar presente na ação. CriAÇÃO. Nem razão, nem emoção: ação. Não é necessário negar nosso repertório, o mais interessante é a nossa capacidade de realocar aquilo que já sabemos. Memória física, utilitária, sócio-política e fictícia dos objetos. O redimensionamento do pacotinho de presente. Dar sentido ao movimento que nasce da pesquisa ao invés de buscar um movimento para determinado sentido. Vou jogar meu corpo na cama! O que a des busca hoje? Estamos dispostos a escancarar mais o que pensamos e sentimos: pela obra, pelo processo artístico? Sair da zona de conforto. Agitar aquilo que está acomodado. Respirar pelo nariz e soltar pela boca. Esparramar. O corpo em queda livre. Subir pelos olhos. A MEMÓRIA É UMA AVALANCHE. Existem diferentes naturezas de memória. Temos que entender melhor os processos da memória para pode selecionar o que realmente interessa. Eu que movo o espaço ou o espaço que me move? Fita de moébius. Encaixes e rotações de úmeros e fêmurs. Se eu fecho os olhos o que eu lembro do Peter: camiseta preta desbotada escrito game over, calça roxa, brinco de lagartixa, pintas no rosto, anel na mão esquerda (ops, memória de outra memória), touro, perdeu a virgindade aos 23, Campo Magro, relação com duas mulheres, … Entrar em todos os buracos possíveis. Yiuki chorando. Mulheres presentes. Aniversário do Tuca. Documentário de arte contemporânea e sua relação com o corpo. memória de uma música, produção de sons. Falhas. Ficções. Caminhando ininterruptamente pelo espaço. O QUE É UM CORPO SEM MEMÓRIAS? A história da boina vermelha. Dor no nervo ísquiotibial. Mãos que abrem espaços no meu corpo. Cuidado com as palavras. Ter mais certezas. Compartilhar a obra com o público. Sentimento bom. A memória dos movimentos. Caos. Transe. Corpo. Tempo. Ação. Palavra. Fresta. Não dá para dar conta de tudo.

quarta-feira, 19 de março de 2014

compartilhando questões

des

Compartilho com vocês alguns questionamentos surgidos nos últimos ensaios e partes do texto escrito semana passada. Voilà:

. . . 

Como se cria memórias? Como criá-las no corpo? Cada instante que passa, cada instante do presente, do agora... e se eu pudesse retê-los? E se eu quisesse guardá-los todos? Se eu pudesse produzir no meu corpo a memória dos teus toques, as memórias das formas desses objetos tão perfeita e fielmente?
Se a memória de alguma maneira define o sujeito e eu não possuo aquilo de que não me lembro eu não possuo você, eu não possuo teus toques, eu não possuo tua carne contra a minha? Será que meu corpo esqueceu? E se as lembranças mudam o tempo todo, o que eu possuo de meu?  Seria possível dizer que eu possuo alguma coisa? Se isso que eu aparentemente possuo se modifica o tempo todo...
Minha memória falha. E se não temos a chance de repetir algo parece às vezes que é quase impossível lembrar. Mas e se os melhores momentos forem justo os irrepetíveis? Eu não os possuo, eu não os possuirei jamais? Mas eles também me compõem, não? Eles também me definem...
Talvez a gente também possa ser definido por aquilo que nos falta, por aquilo que nos escapa... 

_____


O que garante que eu consigo lembrar se sempre quando me lembro construo as imagens como se eu fosse um espectador que assiste à cena de fora? Não consigo lembrar do pertencer ao meu corpo. É como se nas lembranças meu corpo não me pertencesse. Apenas uma profusão de imagens inabitadas...

Parece que quanto mais me esforço para lembrar mais as coisas me escapam. Às vezes eu paro e tento prestar atenção em tudo o que me cerca para tentar reter todas as informações, o cheiro, a temperatura, meu corpo, o sentimento - mas depois não consigo lembrar nada disso.

Sou tomada. Sou tomada por imagens e pensamentos e memórias que não consigo controlar. Não, eu não tenho domínio sobre o que me lembro, não tenho domíni sobre o que penso. Essas coisas é que exercem sobre mim suas forças e me assaltam indefinidamente e independentemente da minha vontade. Eu sinto como se eu não pudesse escolher do que lembrar ou no que pensar. É como se os pensamentos e as lembranças tivessem vida e vontade próprios e eles é que me escolhessem.

Eu me pergunto sobre aquilo de que não lembro.  O quanto essas coisas ainda estão aqui, estão vivas, estão em mim? O quanto fazem parte de uma memóriacarne que não precisa do acesso aos fatos uma vez transformada, atravessada...?

Eu preciso criar minhas ficções diariamente sobre aquilo que sou ou aquilo do porquê vivo para que as coisas pareçam fazer mais sentido. Talvez a memória ajude nisso. Talvez lembrar seja uma questão de sobrevivência.

. . .

tatear a memória é como tatear no escuro uma centena de fios e emaranhados moles, que exigem que eu readeque meu corpo a todo momento a todo momento. Há sempre uma falta.

sexta-feira, 7 de março de 2014

Resignificando a palavra recordação

des, achei interessante encontrar os radicais RE + COR + AÇÃO na palavra RECORDAÇÃO. Como trazer a memória no presente para transformar em sentimento que gera ação. Compartilho um dos meus objetos de estima. Abraços. Yiuki

AMULETO MAORI

Jade Maori hooks

É um amuleto Maori que eu ganhei de uma amiga que vive em Nova Zelândia. Feita de pedra de jade, possui o formato de um anzol que significa abundância, prosperidade e determinação. Desde que ganhei, carrego-o para recordar todos os meus afetos, sejam amigos, amantes ou familiares. Usufruo-o para resignificar o sentido do vazio, da ausência, transformando os não-presentes em re-cor-dar-ações. Assim, a partir do passado, revivo as pessoas em imaginações e fé, idealizo-os no futuro que não aconteceu, trago-os de volta dentro de mim no presente. Nessa viagem de memória, imaginação e fé, ele me traz os sentimentos que vivemos juntos. Em momentos difícieis, apoio nessas sensações para seguir o meu caminho.

terça-feira, 4 de março de 2014

memória x ficção

Coloco aqui o link do espetáculo Ficção, do site da Cia. Hiato (lembrando a todos para dar uma olhada no texto sobre o novo projeto da companhia: Duas Ficções) + 3 links de vídeos do espetáculo que encontrei no youtube. Tenho achado inpirador não apenas pelas questões que eles levantam sobre a ficção, mas também esteticamente. Espaço extremamente intimista, poucos elementos, uma conversa bem “cara à cara”. Gosto muito!
http://www.ciahiato.com.br/o-ficcao.html




sobre a privacidade da memória

Para registrar no blog o link do filme que comentei no ensaio.
E se pudéssemos acessar nossas memórias tal qual elas realmente aconteceram?
Precisamos assistir juntos …
http://www.adorocinema.com/filmes/filme-52423/