Espaço de discussão e reflexão sobre a MEMÓRIA/TEMPO na construção do espetáculo de dança contemporânea "INPUT" da desCompanhia de dança. O projeto foi contemplado pelo Edital de Dança de Produção da Fundação Cultural de Curitiba e será estreado no dia 05 de Junho de 2014 no Teatro Kraide do Portão Cultural em Curitiba. Para maiores informações sobre a cia favor acessar o nosso blog www.descompanhia.blogspot.com

quarta-feira, 19 de março de 2014

compartilhando questões

des

Compartilho com vocês alguns questionamentos surgidos nos últimos ensaios e partes do texto escrito semana passada. Voilà:

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Como se cria memórias? Como criá-las no corpo? Cada instante que passa, cada instante do presente, do agora... e se eu pudesse retê-los? E se eu quisesse guardá-los todos? Se eu pudesse produzir no meu corpo a memória dos teus toques, as memórias das formas desses objetos tão perfeita e fielmente?
Se a memória de alguma maneira define o sujeito e eu não possuo aquilo de que não me lembro eu não possuo você, eu não possuo teus toques, eu não possuo tua carne contra a minha? Será que meu corpo esqueceu? E se as lembranças mudam o tempo todo, o que eu possuo de meu?  Seria possível dizer que eu possuo alguma coisa? Se isso que eu aparentemente possuo se modifica o tempo todo...
Minha memória falha. E se não temos a chance de repetir algo parece às vezes que é quase impossível lembrar. Mas e se os melhores momentos forem justo os irrepetíveis? Eu não os possuo, eu não os possuirei jamais? Mas eles também me compõem, não? Eles também me definem...
Talvez a gente também possa ser definido por aquilo que nos falta, por aquilo que nos escapa... 

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O que garante que eu consigo lembrar se sempre quando me lembro construo as imagens como se eu fosse um espectador que assiste à cena de fora? Não consigo lembrar do pertencer ao meu corpo. É como se nas lembranças meu corpo não me pertencesse. Apenas uma profusão de imagens inabitadas...

Parece que quanto mais me esforço para lembrar mais as coisas me escapam. Às vezes eu paro e tento prestar atenção em tudo o que me cerca para tentar reter todas as informações, o cheiro, a temperatura, meu corpo, o sentimento - mas depois não consigo lembrar nada disso.

Sou tomada. Sou tomada por imagens e pensamentos e memórias que não consigo controlar. Não, eu não tenho domínio sobre o que me lembro, não tenho domíni sobre o que penso. Essas coisas é que exercem sobre mim suas forças e me assaltam indefinidamente e independentemente da minha vontade. Eu sinto como se eu não pudesse escolher do que lembrar ou no que pensar. É como se os pensamentos e as lembranças tivessem vida e vontade próprios e eles é que me escolhessem.

Eu me pergunto sobre aquilo de que não lembro.  O quanto essas coisas ainda estão aqui, estão vivas, estão em mim? O quanto fazem parte de uma memóriacarne que não precisa do acesso aos fatos uma vez transformada, atravessada...?

Eu preciso criar minhas ficções diariamente sobre aquilo que sou ou aquilo do porquê vivo para que as coisas pareçam fazer mais sentido. Talvez a memória ajude nisso. Talvez lembrar seja uma questão de sobrevivência.

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tatear a memória é como tatear no escuro uma centena de fios e emaranhados moles, que exigem que eu readeque meu corpo a todo momento a todo momento. Há sempre uma falta.

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