Espaço de discussão e reflexão sobre a MEMÓRIA/TEMPO na construção do espetáculo de dança contemporânea "INPUT" da desCompanhia de dança. O projeto foi contemplado pelo Edital de Dança de Produção da Fundação Cultural de Curitiba e será estreado no dia 05 de Junho de 2014 no Teatro Kraide do Portão Cultural em Curitiba. Para maiores informações sobre a cia favor acessar o nosso blog www.descompanhia.blogspot.com

segunda-feira, 30 de junho de 2014

Impressões compartilhadas

Temporada de apresentação do INPUT em Curitiba intensa e especial! Segue algumas das impressões que recebemos sobre o trabalho. Muito obrigado pela presença, atenção e carinho.  Equipe desCompanhia.

  • MIRIANE FIGUEIRA: o espetáculo me fez pensar coisas que tinha deixado de pensar. foi lindo.
  • LUCAS TADEU: “… fui envolvido pela magia do espetáculo. A nudez que evoluía durante a dança vulnerabilizava os artistas e assim, uma vez que eles confiavam no público para tal, também eu me vulnerabilizei, e confiei nos integrantes e na dinâmica. A desconstrução da rotina, a dinâmica da memória e a efemeridade da vida nos torna vazios de certa forma, em contrapartida cheios de sentimentos. OBRIGADO por me lembrarem do essencial.
    Extraordinária atuação da equipe e escolha das músicas, meus parabéns!!!”
  • GABRIEL CONTE: Bom ver vcs de novo. Vcs arrasam, sempre. Consegui levar varios amigos, alguns foram ver mais de uma vez. Eles adoraram...
  • FLÁVIO MAGALHÃES: Obrigado pelo trabalho. Pude prestigiar Input ontem. Realmente é uma proposta de trabalho que pode gerar uma série de reflexões, e gerou, no meu caso
    Um abraço.
  • PRISCILA DINIZ: Achei incrivelmente profundo o que fizeram... ficamos horas conversando sobre o que se manifestou em cada um de nos que fomos ver... saiu mt interpretação interessante.
  • SILVIA DUARTE: Parabéns pela apresentação de ontem! Fiquei curiosa para assistir e valeu a pena! ótima performance a todos!
  • KUSUM TOLEDO: Até agora com vontade de chorar habitada por um silêncio novo. Forte. INPUT, uma experiência intensa. Gradecida desCompanhia.
  • RENATA ROEL:
    Memória que evidencia hábitos e modos de se resolver intuitivamente, ou instintivamente. Fiquei com uma sensação de ambiguidade.
    Ao assistir o trabalho, fiquei pensando e olhando para as diferenças nos modos de resolução e do quanto o Jogo revela essas singularidades e ao mesmo tempo os hábitos que também passam a ser característico da Cia. (afinal, tem-se também uma memória de convivência, uma memória de modos de se posicionar no ensaio, na vida que vai pra cena junto e é revelador neste trabalho).
    Pra mim (bem pessoal) existe um lugar do "erro" ou do "não conseguir" realmente que faz a dança acontecer com o público, eu particularmente fico muito junto e curiosa quando sinto que o não saber é real ali em cena, e isso revela muito sobre nosso treinamento de dança... o quanto é difícil a gente errar, a gente entrar em cena no risco sinceramente, pq a gente também com essa possibilidade do treino vai deixando o risco amenizado,  porque o corpo cria hábitos, e intuitivamente a gente é treinado para não errar nunca, e muito menos em cena...
    A possibilidade de levar um jogo pra cena é muito legal enquanto dramaturgia, é ambíguo, ao mesmo tempo em que despessoaliza, pessoaliza. Me mostra ali um rastro (memória) do ensaio, da vida, do como cada um se resolve...é ambíguo porque ao mesmo tempo em que junta os artistas numa condição de estar em cena e junta também os separa nos seus modos distintos de se resolver ou não se resolver....acho que a gente sempre acaba resolvendo no fim das contas, errando ou acertando ou entregando o jogo...
    Essa ambiguidade me deixa interessada e curiosa. Ela aparece desde o início, porque ao mesmo tempo que eu entendia que era um jogo, eu não entendia muito bem a lógica dele, ao mesmo tempo que eu sabia que a música entrava como uma "comemoração" (inventei isso ali) eu não entendia a lógica das roupas...E isso ficou mais evidente no final. Acabou? Acabou!!! Acabou???
    Beijooooooooooooooooooooooo
    Renata Roel

    domingo, 15 de junho de 2014

    I N P U T no Idança!

    desCompanhia de dança

    FONTE: Idança (06/06/2014)

    té o dia 29 de junho, fica em cartaz no Teatro Antonio Carlos Kraide, em Curitiba, o espetáculo INPUT, da desCompanhia de dança. Nova montagem do grupo, o trabalho evoca a memória como metáfora, pretexto e ponto de partida para a criação.

    Em cena, quatro bailarinos praticam o jogo da memória: enquanto jogam, criam uma coreografia que deve ser decorada e replicada. As cartas e a coreografia a serem memorizadas impulsionam a construção de uma dramaturgia dançada, que se compõe em tempo real, a cada apresentação. Além da elaboração do jogo (em pedaços), introduzem, como questão, a criação da memória de cada um (artista e receptor).

    Durante o trabalho, a atualização constante da memória revela novas camadas sensoriais que se ressignificam a cada espetáculo: no percurso da ação, realidade e ficção, universalidade e particularidade se misturam sutilmente no palco; são reelaborados e colocados no mundo novamente.

    No espetáculo, o impalpável e o que se revela: o que é aerado, o que escapa a memória atualizada, a cada dia, a cada minuto.

    Sobre a desCompanhia

    Há 13 anos a desCompanhia de dança vem consolidando sua trajetória no cenário artístico contemporâneo, investindo no trabalho diário de investigação do corpo, na pesquisa continuada, na busca por uma estética particular e no processo colaborativo como método de criação. Utilizando a ideia do corpo único como matéria prima, a pesquisa é pautada na busca do movimento autoral, trazendo para a cena uma fisicalidade poética.

    Foto: © L.P.Daniel

    Serviço:

    INPUT, com a desCompanhia de dança

    Data: De 5 a 29 de junho
    Horário: De quinta a sábado, às 20h e domingo, às 18h
    Local: Teatro Antônio Carlos Kraide – Avenida República Argentina, 3430 – Água Verde, Curitiba/PR
    Entrada franca
    Mais informações: 41 3229-4458 / 3233-8034 / 9601-8553 / descompanhia@gmail.com

    Direção: Cintia Napoli Dramaturgia e Concepção: Tuca Pinheiro Criação e Performance: Juliana Adur /Mariana Mello / Peter Abudi / Yiuki Doi

    Le corps, lieu d´utopies - Michel Foucault

    des, a Mari Paula (BTG) me deu esse presente e passo para vcs. Para reavivar a memória daquilo que já sabemos, mas que somos tentados a esquecer.
    Conferência de Michel Foucault, chamada Le corps, lieu d´utopies (de 1966).
    Cintia Napoli

    Conferência de Michel Foucault: Le corps, lieu d´utopies (1966)

    Basta eu acordar, diz Foucault, que não posso escapar deste lugar, o meu corpo. Posso me mexer, andar por aí, mas não posso me deslocar sem ele. Posso ir até o fim do mundo, posso me encolher debaixo das cobertas, mas o corpo sempre estará onde eu estou. Ele está aqui, irreparavelmente: não está nunca em outro lugar. Meu corpo é o contrário de uma utopia. Todos os dias, continua Foucault, eu me vejo no espelho: rosto magro, costas curvadas, olhos míopes, nenhum cabelo mais... Verdadeiramente, nada bonito. Meu corpo é uma jaula desagradável. É através de suas grades que eu vou falar, olhar, ser visto. É o lugar a que estou condenado sem recurso.

    É possível que contra esse corpo tenham nascido todas as utopias, dele nasce a utopia original - a de um corpo incorporal: o país das fadas, dos elfos, dos gênios, onde as feridas se curam imediatamente, onde caímos de uma montanha sem nos machucar, onde podemos ficar invisíveis.

    Há outra utopia dedicada a desfazer o corpo é o país dos mortos. A múmia é o corpo utópico que desafia o tempo. Há as pinturas e esculturas dos túmulos, que prolongam uma juventude que nunca vai passar, que será eterna. Meu corpo se torna sólido como uma coisa, e eterno como um deus.

    A outra, a maior utopia criada contra o corpo é o grande mito da alma, que funciona maravilhosamente dentro do meu corpo, mas escapa dele. É bela, pura, branca, ao contrário do meu corpo. Durará para sempre. É meu corpo luminoso, purificado.

    Assim, pela mágica dessas utopias, meu corpo pesado e feio desaparece magicamente. Recebo-o de volta fulgurante e perpétuo.
    Mas meu corpo, nele mesmo, seus recursos próprios de fantástico. Tem lugares sem-lugar. Tem seus lugares obscuros e praias luminosas. Minha cabeça é uma estranha caverna, com duas aberturas, meus olhos. E, se as coisas entram na minha cabeça, ficam ao mesmo tempo fora delas.

    Corpo incompreensível, penetrável e opaco, aberto e fechado: corpo utópico. Absolutamente visível - porque sei o que é ser visto e ver os outros. Mas esse corpo é também tomado por uma certa invisibilidade: minha nuca, por exemplo. Minhas costas: conheço seus movimentos, sua posição, mas não as vejo. Corpo que é um fantasma, que só posso ver pelo truque, pela miragem de um espelho.

    Esse corpo não é uma coisa: anda, mexe, quer, se deixa atravessar sem resistências por minhas intenções. Só quando estou doente –dor de estômago, febre - ele se torna coisa, opaca, independente de mim.

    Não, o corpo não precisa de fadas e almas para ser utópico, visível e invisível, transparente e concreto. Para que eu seja utopia, preciso apenas ser... um corpo. As utopias não apagam o corpo: nasceram dele, para só depois, talvez, voltarem-se contra ele.
    Uma coisa, entretanto, é certa: o corpo humano é o ator principal de todas as utopias. O sonho de um corpo imenso, o mito dos gigantes, de Prometeu, é uma utopia. O sonho de voar também.
    O corpo é também ator utópico quando se pensa nas máscaras, na tatuagem, na maquiagem. Não se trata, aqui, propriamente, de adquirir um outro corpo, mais bonito ou reconhecível.

    Trata-se de fazer o corpo entrar em comunicação com poderes secretos, forças invisíveis. Uma linguagem enigmática e sagrada se deposita sobre o corpo, chamando sobre ele o poder de um deus, a força surda do sagrado, a vivacidade do desejo. Fazem do corpo o fragmento de um espaço imaginário, que entra em comunicação com o universo dos outros, dos deuses, das pessoas que queremos seduzir.

    O corpo é arrancado de seu espaço próprio e arremessado a um outro espaço. As vestimentas religiosas, por exemplo, fazem o indivíduo entrar no espaço cercado do sagrado, ou na comunhão da sociedade. Tudo o que toca no corpo, uniformes, diademas, faz florescerem as utopias internas do corpo.

    E a carne nela mesma pode ser também utópica. Faz o corpo voltar-se contra si: o outro mundo, o contra-mundo, penetra nesse corpo, que se torna produto de seus fantasmas: o corpo de um dançarino, por exemplo, é um corpo dilatado pelo espaço – espaço que lhe é interior e exterior ao mesmo tempo. O corpo do mártir acolhe a dor e a salvação. O corpo de um drogado, de um possuído, de um estigmatizado, recebe em si o que lhe é exterior.
    Bobagem dizer portanto, como fiz no início, que meu corpo nunca está em outro lugar. Meu corpo está sempre em outro lugar. Está ligado a todos os outros lugares do mundo, e está num outro lugar que é o além do mundo. É em relação ao corpo que existe uma esquerda e uma direita, um atrás e um na frente, um embaixo e um em cima.

    O corpo está no centro do mundo, nódulo utópico a partir do qual penso, sonho, me comunico. O corpo, como a Cidade de Deus, não tem lugar, e é de lá que se irradiam todos os lugares possíveis.
    Apenas o espelho e o cadáver selam e calam essa voragem utópica. Os dois estão num outro lugar impenetrável, mas nesse momento já não sou eu mesmo. Para que eu seja eu mesmo, no meu corpo, sem utopia, é preciso uma situação bem definida. Só o ato amoroso, quando nos entregamos a ele, acalma a utopia do nosso corpo: por isso é tão próximo, no imaginário, ao espelho e à morte. É porque só no amor o meu corpo está AQUI.

    quinta-feira, 29 de maio de 2014

    INPUT é o novo trabalho da desCompanhia de dança!

    DE 05 A 29 DE JUNHO, no TEATRO ANTONIO CARLOS KRAIDE (Portão Cultural) em Curitiba


    Em cena,  quatro bailarinos jogam o jogo da  memória: enquanto jogam, criam uma coreografia que deve ser memorizada e replicada. As cartas e a coreografia a  serem memorizadas impulsionam a construção de uma dramaturgia dançada, que se constrói em tempo real, a cada espetáculo. Como questão, além da construção do jogo (em pedaços), a construção da memória de cada um  (artista e receptor).
    Durante o trabalho, a atualizacão constante  da memória revela novas camadas  sensoriais que se resignificam a cada espetáculo: no percurso da ação, realidade e ficcão, universalidade e particularidade se misturam sutilmente no palco; são reelaborados e colocados no mundo novamente.
    A concepção e dramaturgia do espetáculo ficou a cargo do artista mineiro, Tuca Pinheiro. Segundo a diretora artística do espetáculo, Cintia Napoli, “Tuca veio para sinalizar um modo novo de criar”. Em cena os bailarinos criadores: Juliana Adur, Peter Abudi, Yiuki Doi e Mariana Mello.
    No espetáculo, o impalpável e o que se revela: o que é aerado, o que escapa, a memória atualizada, a cada dia, a cada minuto.
    INPUT é sobre  entradas. E saídas. E sobre lembrar-se: afinal, somos o que somos porque somos memória. 

    INPUT
    desCompanhia de dança
    Direção: CINTIA NAPOLI
    Dramaturgia e Concepção: TUCA PINHEIRO
    Criação e Performance: JULIANA ADUR / MARIANA MELLO / PETER ABUDI / YIUKI DOI

    DE 05 A 29 DE JUNHO DE 2014 – QUINTA A SÁBADO ÀS 20HS
    DOMINGO ÀS 18H
    ENTRADA FRANCA


    TEATRO ANTONIO CARLOS KRAIDE
    Avenida República Argentina, 3430 - Água Verde
    INFO: 41 3229-4458 / 3233-8034 / 9601-8553
    descompanhia@gmail.com

    Input 

    FICHA TÉCNICA:

    • Argumento: desCompanhia de dança
    • Direção: Cintia Napoli
    • Concepção e Dramaturgia: Tuca Pinheiro
    • Assistente de Direção: Juliana Adur
    • Criação e Performance: Juliana Adur, Marina Mello, Peter Abudi e Yiuki Doi
    • Iluminação e operação de luz: Fernando Dourado
    • Trilha sonora: Tuca Pinheiro
    • Operação de som: Cindy Napoli
    • Frigurino: Eduardo Giacomini
    • Paisagem sonora externa: Edith de Camargo
    • Voz em off: Paolla de Andrade Torrilhas
    • Texto criado por: Juliana Adur, Marina Mello, Peter Abudi e Yiuki Doi
    • Assessoria de Imprensa: Fernando Proença
    • Ilustração: L. P. Daniel
    • Comunicação Visual: Maria Baptista
    • Direção de produção: Cindy Napoli

    sexta-feira, 16 de maio de 2014

    Depoimentos sobre Memórias

    Texto colaborativos por Juliana Adur, Peter Abudi, Mariana Mello e Yiuki Doi. Revisão do texto: Edith de Camargo e a Cintia Napoli.
    O texto surgiu de um exercício que a nossa diretora artística Cintia Napoli trouxe para o grupo. Depois de tantos laboratórios e pesquisas individuais e coletivas sobre memória, a proposta era construirmos um texto do grupo que referisse sobre a memória. Então fizemos um jogo de contar história com os quatros bailarinos criadores em roda, um começava a falar sobre a memória, depois de um tempo a outra pessoa continuava com a história, acrescentando novos pensamentos sobre tudo que já tinha sido dito pela pessoa anterior. Esse era o nosso jogo: criar um texto como se fosse uma única pessoa falando sobre a memória. Esse texto gravado ficou imenso e ficou interessante, parece até um documentário. Então a Edith e a Cintia selecionaram trechos da gravação que seriam utilizados para o nosso espetáculo.

    Depoimentos sobre Memórias:

    Fico mais questionando o mundo, do que me relacionando com ele intensamente. sinto muitas vezes que a memória tem a ver com emoção, a emoção do envolvimento com os acontecimentos. Por mais que eu me lembre da história que aconteceu, sempre me imaginei desgrudado do mundo. Nunca me senti tão à vontade em cada lugar, seja na família ou na escola. E apesar da história ter passado, parece que faltou esse laço emotivo de pertencimento àqueles espaços e parece que isso cria um lapso de memória em mim. Poucas coisas consigo lembrar. A memória tem a ver com essas questões, não com a história e sim como você colhe o mundo e se aproxima dele.

    ***

    É uma coisa tão ampla que a gente não consegue agarrar. Tem muitas coisas que fico tentando lembrar, eu tenho dificuldade em prestar atenção em tudo que tá acontecendo o tempo inteiro. Algum detalhe sempre passa desapercebido.

    Não que a gente consiga memorizar tudo que a gente tá vivendo à todo momento mas eu sinto que perco muito mais coisas do que a maioria das pessoas perde. E muito mais coisas passam desapercebidos por mim. Quando converso com pessoas e a gente tenta lembrar de determinadas situações que aconteceram em comum, tenho buracos ou lapsos de memória que são muito grandes e fico tentando preenchê-los e não consigo. E quando me contam como era o real, parece que vou criando uma colagem de memórias e ela vai ficando cada vez mais fictícia. Então a sensação que eu tenho, é que nenhuma memória é real.

    ***

    Que que faz um momento importante para mim, fico me perguntando as vezes. Eu não sei se é porque sou uma pessoa introspectiva, como já disse, não gosto muito de falar… fico mais quieto.

    ......

    Tenho uma imagem muito clara do meu pai lavando um Chevette vermelho no quintal da minha casa. Eu me vejo numa foto, sentado no capo dele de uniforme da escola. Meu pai tirou essa foto. Só que essa foto não existe, não sei, a foto eu criei, acho. Eu devo ter inventado ela. As vezes acho que é quase impossível. Porque o Chevette vermelho é inconfundível. Não tem como eu errar cor ou errar o carro. Pra mim ele existe e ponto.

    E minha mãe tem essa mania de sempre me contradizer, que não, que não era bem assim, que essa memória está incompleta ou que estou inventando.

    Então por isso as vezes prefiro me calar pra deixar esse momento em mim.

    ***

    De onde vem essa ilusão que eu criei e que acho que é uma verdade... me dá uma sensação de verdade...

    Falar de memória é um pouco complicado. Memórias parecem melhores ou mais bonitas do que o momento presente que sempre vem junto com tantas contradições.

    Muitas coisas atravessando… imagens idealizadas... muitas informações.... As camadas que se misturam são confusas.

    Por isso fico quieta muitas vezes. Prefiro não falar pra tentar ficar rememorando em mim mesmo.

    Deixo isso tomando espaço dentro de mim.

    Igual essa imagem do Chevette.

    ***

    Eu sinto que a memória tem uma questão imaginativa, você vai completando o laço afetivo para resgatar sensações. Aquela pessoa que você gosta, você atualiza no presente. As memórias atualizadas criam um sentido para aquilo que eu busco.

    Em cada fase da vida a gente tem uma memória diferente. Quando era criança o tempo era diferente, era muito estendido, não pensava tanto no futuro, no passado... o presente era incrível, era uma aventura. Você ir no parque era uma floresta para você desvendar.

    Depois a gente aprende ter um relógio.

    Hoje é diferente, como me relaciono com o presente tem a ver com como me relaciono com minha memória. E não tenho controle sobre esses vãos entre passado e futuro.

    ***

    Nunca tive muitas memórias. Meus irmãos sempre falaram, “lembra de tal coisa…”? Eu não me lembro de muitas coisas da infância. As coisas que me marcaram muito foram muito fortes e deixei elas meio separadas/afastadas, essas memórias. De certa forma acho que ficaram como um trauma. Crio um certo distanciamento e prefiro não tocar em alguns assuntos.

    ***

    Um trauma eu trago do dia que caí da árvore. A gente estava brincando, eu e os meus irmãos...... era um abacateiro...

    Tenho medo de pombo e tenho medo de altura também. E é uma coisa incontrolável as vezes. Quando vejo, já tô passando muito mal.

    Eu já perguntei pra minha mãe, se ela tinha me levado para um lugar muito alto quando era criança, pra onde a gente viajou, que lugares a gente conheceu, onde poderia ter passado por uma situação específica e ter desenvolvido isso. E ela falou, que não se lembra de absolutamente nada assim. No máximo foi no dia da formatura da minha irmã quando a gente subiu um morro e o ônibus passava muito, muito perto a beirada da estrada. E tava todo mundo desesperado, achava que o ônibus ia cair. Mas, até que ponto que realmente uma situação dessa vai provocar um pânico, ou uma sensação física forte quando a gente chega na fase adulta, eu não sei.

    ***

    O Nando acorda no mesmo horário todos os dias, toma café da manhã do mesmo jeito, no mesmo lugar, ao lado da filha, e consegue dar conta da rotina, mas tem dias que não lembra do nome da filha.

    Irracional.

    Incontrolável.

    Onde fica a memória em toda essa história, que aparece e desaparece?

    A emoção apaga a memória, o trauma físico apaga ela. Quando caí da árvore, apagou minha memória, desmaiei acho, não consigo lembrar…

    Lembro que estava deitado no colo da minha mãe quando acordei.

    O tempo da memória é algo muito intrigante.

    É uma questão espaço/tempo. Uma questão quântica.

    Onde é que eu estou?

    Estou no presente? Estou no passado? No futuro?

    Isso me intriga muito, onde é que eu estou.

    Existe algo, que está sendo registrado no corpo.

    O contorno da realidade.

    … em que memória posso me apegar como real?

    Tecnologias afastam a experiência real das coisas?

    A sensação é, que tudo vai escorregando…

    Tenho quase certeza que inventei isso. Tenho a sensação que invento relações afetivas com minhas memórias.

    Enfeitá-las, torná-las mais interessantes.

    Não posso chegar perto de uma sacada no décimo-quinto andar. É incontrolável.

    ***

    sexta-feira, 9 de maio de 2014

    Minha memória compartilhada: Paredes do banheiro e Não há sentido…

    des, segue os dois textos que estou com dúvidas para a cena da carta azul. Yiuki

     

    Paredes do banheiro

    Quando eu era pequeno tinha um banheiro fora da casa, onde também era o nosso local de castigo.

    Às vezes minha mãe encontrava-me sozinho nesse banheiro, fazendo nada, sentado no assento tampado. Vendo a situação estranha, ela perguntava: – Filho, o que está fazendo ai? Eu respondia: - Estou de castigo, pois fiz algo errado.

    Não era triste, nem alegre aquele banheiro. Sabia que era um lugar que eu precisava ficar, somente isso.

    Anos passaram, sai de casa e acabei me afastando dos meus pais, pois não consegui realizar algo que os filhos de japoneses costumam realizar.

    Assim, decidi ficar no banheiro.

    Busquei romper os laços, entrei no silêncio.

    Queria que os meus pais se afastassem de mim.

    Achei que tinha conseguido.

    Mas ano passado recebi uma encomenda através do meu irmão, um pacote com comidas japonesas enviadas pela minha mãe, nela havia uma etiqueta escrita “Com carinho”.

    Talvez ser filho não é uma questão de merecer ou não...

     

    Não há sentido…

    Meu pai sempre foi agricultor, por isso fui criado na roça até os meus 7 anos. Nesse período não tive amigos, as crianças que eu podia brincar eram as minhas duas irmãs. Lembro-me delas brincarem de cozinhar, e eu ficava com raiva porque não encontrava sentido naquela brincadeira. Aos 7 anos eu precisava estudar, então fui morar com a minha vó que morava próximo de uma escola. Achei que teria amigos, mas eu era muito delicado e também inteligente. Lembro de um paredão e uma roda de crianças me cercando, no centro estava eu e um menino. Eu precisava brigar com ele. Não entendia por que precisava brigar, não encontrava sentido nisso. Eu recuava, recuava e recuava. Ouvia outras crianças incentivando a briga. Lembro de uma voz: Ele não reage, parece até uma menina. O menino avançava, dando-me empurrões para tras e para o chão. Eu não briguei naquele dia. E como não reagi, as crianças foram embora. Não há sentido em muitas coisas da vida.

    quinta-feira, 8 de maio de 2014

    旅愁 - "Dreaming of Home and Mother"

    Minha canção escolhida. Original é inglesa, com uma letra diferente, pois a versão japonesa fala de um viajante solitário que não consegue visitar a terra natal, pois ainda não concretizou o seu sonho. Yiuki

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    H. J. Wehman, Song Publisher. 50 Chatham St., New York.

    Dreaming of Home and Mother.

    Dreaming of home, dear old home,
    Home of my childhood and mother—
    Oft when I wake ‘tis sweet to find
    I’ve been dreaming of home and mother.
    Home, dear home, childhood’s happy home!
    When I played with sister and with brother
    ‘Twas the sweetest joy when we did roam
    Over hill and through dale with mother!

    Sleep, balmy sleep, close mine eyes,
    Keep me still thinking of mother—
    Hark! ’Tis her voice I seem to hear—
    Yes, I’m dreaming of home and mother.
    Angels come soothing me to rest,
    I can feel their presence as none other,
    For they sweetly say I shall be blest

    Childhood has come, come again,
    Sleeping I see my dear mother—
    See her loved form beside me kneel
    While I’m dreaming of home and mother.
    Mother dear, whisper to me now,
    Tell me of my sister and my brother—

    quinta-feira, 1 de maio de 2014

    sobre o jogo e nós - escancarados?


    Não sei se consigo ter noção do quanto o jogo nos escancara. O Tuca dizia que era bom que a gente não tivesse. Então, não me preocupo.
    Mas às vezes acho que sinto, simplesmente sinto. Não sei bem explicar, mas sinto. Minha dificuldade de ir, meu esforço pra tentar. O lutar por uma coisa, lutar lutar e, não conseguindo, me culpar e sempre achar que não dei o suficiente, que sou a única responsável por meus próprios fracassos - e não é assim mesmo?. E começo a achar que nunca acerto, que as coisas nunca dão certo comigo, uma espécie talvez de autopiedade que me irrita. Mas que persiste. E aí tudo se mistura. Me sinto só. E me sinto culpada por me sentir só. Me sinto inerte. E me sinto culpada por me sentir inerte. Tenho medo de parecer a bailarina inexperiente que não consegue sequer decorar uma sequência, ainda que eu saiba que há muito mais coisas em jogo. E me sinto culpada. Sempre me sentindo culpada. A partir de quando, na minha vida, isso começou a ser assim? Eu comecei a me exigir assim, a me cobrar assim, a ser tão pouco generosa comigo?
    Será que eu invento essas coisas pra mim mesma?

    Como transformar essa culpa e essa 'ineficiência' ou 'insuficiência' em movimento? Em minha dança? Como não deixar essa inércia tomar conta de mim?  Como não ser sempre tão sozinha? Essa sensação de inadequação que sempre persiste... Tanta camada que se mistura...

    Coloco  por fim um trecho do livro A Casa do Incesto, da Anaïs Nin. Que acho que diz bastante sobre mim e sobre esse momento.

    "Ouço o passar de mistérios e o respirar de monstros. Só acordes perfeitos ou sussurros. O choque com a realidade obscurece-me a visão e submerge-me no sonho. Sinto a distância como uma ferida. A distância desenrola-se diante de mim como um tapete, posto antes dos degraus da catedral por casamento ou enterro. Desenrola-se como uma noiva vermelha entre os outros e eu, mas não consigo pisá-la sem um sentimento de desconforto como o que se tem nas cerimónias. A cerimónia de pisar a carpete desenrolada até ao interior da catedral onde têm lugar os ritos a que sou estranha. Não caso nem morro. E a distância da multidão entre os outros e eu, não pára de aumentar.
    Distância. Nunca avancei pelo tapete até as cerimônias. Até a plenitude da vida da multidão, até a música autêntica e até ao cheiro dos homens. Nunca assisti a casamentos nem a enterros. Para mim tudo teve lugar na solidão do campanário com o som ensurdecedor dos sinos apelando com vozes de ferro, ou na cave onde roía juntamente com os ratos as velas e o incenso armazenados.
    Não posso ter a certeza de nenhum acontecimento ou lugar a não ser da minha solidão. Diz-me pois o que as estrelas contam de mim. Será que saturno tem olhos de cebola que não param de chorar? Mercúrio tem penas de galinha nos calcanhares? Marte usa uma máscara de gás? Os gémeos, os gémeos desdobrados, será que se desdobram continuamente ao rolarem num espeto, Gémeos à la broche?
    Há no meu ohar uma ruptura por onde a loucura sempre escoa."



    quinta-feira, 24 de abril de 2014

    nas páginas 110. do Saramago

    A mãe e os filhos chegaram a Lisboa na Primavera de 1924. Nesse mesmo ano, em Dezembro, morreu o Francisco. Tinha quatro anos quando a broncopneumonia o levou. Foi enterrado na véspera de Natal. Em rigor, em rigor, penso que as chamadas falsas memórias não existem, que a diferença entre elas e as que consideramos certas e seguras se limita a uma simples questão de confiança, a confiança que em cada situação tivermos sobre essa incorrigível vaguidade a que chamamos certeza. É falsa a única memória que guardo do Francisco? Talvez o seja, mas a verdade é que já levo oitenta e três anos tendo-a por autêntica...

    Livro: AS PEQUENAS MEMÓRIAS de José Saramago.


    fica aqui uma vontade de confiar em nossa memória, acreditar e coloca-la para fora de um jeito especial, às vezes não com tanta certeza, mas, pensando o como a colocamos no mundo/ espetáculo.


    Pedro. 

    terça-feira, 22 de abril de 2014

    tentativa de...

    http://letras.mus.br/tsuyoshi-nagabuci/507850/traducao.html


    atenção para o meu sotaque Japonês hein gente!!!

    cantando

    Brindemos

    Pensando nos fortes laços de amizade
    Da juventude, cujos dias não nos cansamos de narrar:
    Oras mágoas, oras alegria
    E aquele dia em que os amigos deram força um ao outro?
    Quanto tempo terá passado desde aquele dia?
    Quantos ?pôr de sol? foram contados?
    O amigo da terra natal
    ainda permanece dentro do seu coração?

    Brindemos! Pois agora você está sobre o
    Grande, grande palco da vida,
    E começou sua caminhada sobre uma longa e distante estrada
    Que você seja feliz!

    Aquelas duas pessoas sob a luz de velas
    Estão se entreolhando dessa forma
    Grandes alegrias e poucas tristezas
    Quero cantar com grande emoção ,
    Banhando-se na luz do amanhã
    Siga sem olhar para trás
    Mesmo contra o vento, mesmo contra a chuva
    Só não vire as costas para o amor no qual você acredita.


    a música que cantei (traduzida) para vocês no ensaio.

    segunda-feira, 21 de abril de 2014

    dias com José Saramago...

    tive que escolher um livro, fui pelo título e depois pelos autores e me caiu na mão "AS PEQUENAS MEMÓRIAS" José Saramago.

    "Às vezes pergunto-me se certas recordações são realmente minhas, se não serão mais do que lembranças alheias de episódios de que eu tivesse sido actor inconsciente e dos quais só mais tarde vim a ter conhecimento por me terem sido narrados por pessoas que neles houvessem estados presentes, se é que não falariam, também elas, por terem ouvido contar a outras pessoas."

    Fico a pensar em minhas/nossas memórias, de como está sendo gostoso e proveitoso aproveitá-las e utiliza-las, misturando todas e deixando com as nossas caras.


    pEDRO pAULO.

    quarta-feira, 9 de abril de 2014

    segunda-feira, 7 de abril de 2014

    cheiros

    gente ontem vi isso na tv e gostei um pouco de saber como ela resgatou a memóri dela. olhem ai.

    http://g1.globo.com/fantastico/noticia/2014/04/marido-tem-que-reconquistar-mulher-que-perdeu-11-anos-de-memoria.html



    Marido tem que reconquistar mulher que perdeu 11 anos de memória

    Sabrina tem marido e três filhos. Mas, um dia, acordou e não reconhecia mais a própria família, nem a casa, nem os amigos.

    Sabrina tem marido e três filhos. Mas, um dia, acordou e não reconhecia mais a própria família, nem a casa, nem os amigos. Ela tinha esquecido seus últimos 11 anos de vida e teve que empreender uma emocionante jornada de volta.
    O nome dela é Sabrina, disso ela nunca se esqueceu. Mas, de repente, outras referências tão íntimas quanto o próprio nome desapareceram da memória dela. A empreendedora responsável por projetos sociais no mundo todo, mãe de três filhos, passou mal em casa e foi dormir.
    “Quando acordou, já não era a Sabrina, já tinha ido embora. A Sabrina que tinha voltado era uma Sabrina completamente diferente da pessoa que eu conhecia”, lembra o marido de Sabrina, Rafael Velasco.
    “Eu já não sabia onde eu estava, quem era ele, as crianças, a casa, nada”, ela conta.
    Foi em julho de 2013. “Eu não sei o que aconteceu no dia, tem que perguntar para ele”, brinca Sabrina.
    O espanhol Rafael é o segundo marido da Sabrina. “Até que ele viu que a coisa era grave e chamou uma ambulância”, conta.
    Desorientada, Sabrina afirmava para os médicos: estamos em maio de 2002. “Na minha mente, eu estava com 21 anos, eu já tinha voltado 11 anos atrás”, lembra.
    Só que em 2002, Sabrina era casada com Vinicius, e o filho mais velho, hoje com 12 anos, tinha três meses de idade. O que aconteceu de 2002 até 2013 foi o que se apagou da memória dela.
    “Todas as nossas experiências juntos, ela não se lembrava”, diz o menino.
    “Ela chamava o ex-marido dela, que é o pai do ‘bebê’. ‘E o Vinicius? Onde está o Vinicius?’. Eu dizia: ‘filha, o Vinicius não é mais o seu marido’. E ela ficava desesperada: ‘mãe, como assim? Você está querendo me enganar por quê?’”, explica a mãe Doris Campos.
    Quando deixou o pronto-socorro, Sabrina achou que voltaria para o endereço de 11 anos antes.
    “Minha mãe me levou para a minha casa, e eu falando para ela:’ mãe, eu não moro no oitavo andar, eu moro no sexto. E esse daqui não é o meu prédio’”, lembra Sabina.
    Fantástico: Quando ela entrou no apartamento, qual foi a reação dela?
    “Ela ficou assustadíssima, e querendo sair e a gente forçando ela a entrar e ela querendo sair. E o pior era ver aquelas criancinhas assim buscando a mãe”, conta a mãe.
    Tentando uma resposta, Sabrina e a mãe dela passaram pela emergência de mais três hospitais.
    Um deles foi o Hospital das Clínicas de São Paulo. Os exames neurológicos não revelaram nenhum problema físico. No prontuário, o diagnóstico foi transtorno dissociativo de memória. Sabrina foi orientada a tomar remédios e a procurar um psiquiatra.
    Adriana Fizman, especialista da Universidade Federal do Rio de Janeiro, explica que a causa desse tipo de amnésia geralmente são traumas que o paciente não enfrentou direito, como se o sofrimento fosse sempre adiado.
    “Trauma emocional muito intenso, vividos principalmente nas vidas de infância, adolescência”, ela explica.
    De fato, Sabrina conta que seu passado foi marcado por um caso de abuso e por algumas perdas violentas, episódios que ela deixou meio de lado. E que, já adulta, ela dormia muito pouco e trabalhava demais.
    “O estresse, a má alimentação, a falta de sono podem desencadear uma doença cardíaca em um, transtorno do pânico no outro. No caso dela, fez com que ela adoecesse dessa forma”, avalia a especialista.
    Sabrina começou a usar a medicação prescrita no hospital, mas não se adaptou aos efeitos que os remédios causavam.
    “Quando eu tomava a medicação, não me lembrava de nada. E quando passava o efeito, eu começava a lembrar de algumas coisas. E aí eu comecei a anotar em um caderno”, conta.
    E começou a abrir uma porta para os 11 anos esquecidos.
    Sem a memória dos últimos anos, Sabrina começou a andar muito por São Paulo tentando reconhecer a cidade, os lugares que frequentava, os amigos. E, nessa busca pela identidade, descobriu que algumas coisas a mente dela tinha apagado, mas o coração, não.
    Logo nas primeiras semanas de amnésia, Sabrina tinha percebido que o contato com as pessoas mais próximas estimulava a memória afetiva e confiou nelas.
    “Fui para o Parque Trianon com a minha mãe e a minha irmã e com um amigo dela, e eu vi as pessoas com tablet tirando fotos. Eu olhava aquilo e falava: ‘como assim? Vocês estão falando que eu estou em 2013, quer dizer que no futuro em vez de as coisas ficarem menores elas ficam maiores? Por que as máquinas fotográficas ficaram desse tamanho?’”, lembra.
    E ouviu de um amiga as palavras que a fizeram tentar de vez retomar a própria história: “Você já decidiu ter essas crianças, eles são fato na sua vida. Eles estão vivendo o luto de uma mãe viva. Eles sabem que você não lembra deles, eles precisam de você’. Acho que, na mesma noite, eu liguei para o Rafa e falei: ‘fica tranquilo que eu vou voltar’”, diz.
    Foi aí que começou o trabalho pesado. “Percebi que a minha memória voltava quando eu sentia determinados cheiros ou escutava alguma coisas. Vinham imagens na minha cabeça”, relata.
    Em uma tentativa de resgatar as memórias, a família da Sabrina organizou um encontro com amigos de várias épocas, da infância, da adolescência, amigos do trabalho, amigos que ela tinha conhecido recentemente. E aí eles foram contando histórias da vida dela para ela.
    A ideia era que, misturados às histórias mais antigas, vivas na memória da Sabrina, os 11 anos perdidos voltassem à tona.
    Como o crescimento da irmã, de 13 anos.
    “Eu estava passando os meus melhores dias da minha vida com ela, ela me levou em eventos, ela estava realizando o meu sonho. E eu vou começar a chorar. E do nada ela esqueceu de mim e eu não podia falar com ela”, lembra a irmã Camila Campos
    Sabrina tapou os olhos e abriu bem o olfato e a audição.
    “Então, pouco a pouco, eles foram se apresentando a mim, eu segurava nas mãos deles e perguntava, quem sou eu pra você?”, conta Sabrina.
    “Ela me cheirou e lembrou do perfume. Foi uma coisa meio estranha, mas a gente já conhece ela. A gente sabia que o processo seria diferente”, brinca Aniele.
    “Acabei reconhecendo a grande maioria pelo cheiro e também pela voz”, diz.
    “Eu falava para o Rafa: ‘eu estou lembrando de mim grávida das crianças, estou lembrando do nosso casamento’. E eu comecei a chorar muito, fiquei muito emocionada”, conta.  
    E um dia sentiu que estava de volta. “Minha memória voltou no dia 30 de dezembro, eu já comecei o ano de 2014 em 2014”, comemora.
    “Ele teve que fazer eu me apaixonar por ele de novo. Porque eu não aceitava ele de forma alguma”, diz Sabrina.
    “Foi fácil, ela é o amor da minha vida. Com muito amor, a gente conseguiu”, brinca o marido.

    quarta-feira, 2 de abril de 2014

    Avalanche

    É  a palavra de hoje. Avalanche. É difícil lidar com ela. Às vezes parece que é muito e muito e às vezes parece que não há nada.  que eu fiquei num limbo sem memórias nem palavras. A avalanche pode ser racionalizada? É um pouco sobre a angústia da falta de controle, sobre o ser tomada. Mas às vezes talvez falte  o ímpeto dos impulsos. Mas como não ser apenas desordem? E se a natureza da avalanche for justamente a da (e a da produção de) desordem? Dificuldade de me ater a uma única ideia. Assim como a própria ideia de avalanche, de algo que vai crescendo e tomando tudo ao seu redor, talvez um pouco assim meus pensamentos. Uma pequena impressão ou ideia vai crescendo crescendo e é difícil manter o que havia antes. 
    É como se às vezes viesse uma avalanche bem branca e ficasse apenas o vácuo e as coisas sendo sugadas, tudo desestruturando de uma maneira bonita. Mas como achar essa força?
    Como ser avalanche autêntica e não interpretação da avalanche?

    IMPRESSÕES DO ENSAIO DE 27.03

    Por Mariana Mello

    domingo, 30 de março de 2014

    Sabedoria do corpo

    des, nos laboratórios de criação junto ao Tuca Pinheiro e a Cintia Napoli, algumas frases/ideias ficaram marcantes para mim. Compartilho algumas delas no nosso díario de bordo:

    • Se racionalizar demais é como se estiver menosprezando o corpo, o que já é, o que já existe e sabe.
    • O sujeito da ação é a ação.
    • O corpo existe no coletivo.
    • O corpo imagético não é privado, é um corpo público.
    • Como transformar a imagem em potência pública? O público entra na imagem construída e cada um leva o que fica dela.
    • Falar da memória para resgatar os sentidos das coisas.
    • Memória não é somente uma lembrança, ela é uma forma de ver e interagir com o mundo.
    • Padrão não é ruim, ele precisa ser um dispositivo par avançar/evoluir.
    • Como acessar as memórias das pessoas sem precisar saber dos fatos pessoais?
    • Padrão talvez seja uma memória calcificada.
    • Como transformar o que está em cena em memória do público?
    • A questão da memória é muito ampla, não conseguimos dar conta de tudo, então precisamos partir desse ponto.
    • O que do individual se torna coletivo? Talvez podemos ir para o corpo como corpo.
    • O que não está no corpo vira pastiche.
    • Memória é quando faz alguma coisa com a história. Dessa maneira, memória não é simplesmente uma história. Fazemos algo com a memória, ela fica em algum lugar do corpo.

    Deixo recortado um trecho que encontrei de um livro sobre Nietzsche que o prof. de filosofia Tulio Tibério da UNICENTRO-Irati me indicou. No final da postagem, a quem se interessar, deixo o tema “Sabedoria do corpo” do Capítulo IV do livro na integra. É uma leitura curta, rápida e gostosa ;) Yiuki Doi

    “Partindo da consciência, formas-se uma representação superficial e aberrante da vida psíquica, cai-se vítima da falsa separação entre a alma e o corpo, é-se irresistivelmente atraído para o Idealismo e fascinado pelas miragens da metafísica. Pretende-se, ao menos uma vez, ter os meios de uma interpretação adequada da realidade, não ter nenhuma hesitação: é preciso, afirma Nietzsche, deixar de conceber crédito à consciência e se voltar para o corpo. Pois é o corpo o único que tem condições de nos instruir sobre o valor de nossa personalidade profunda. Colocarmo-nos, para decifrar o mundo, no ponto de vista do corpo […] é preciso admitir que esse pensamento corporal, inconsciente, com toda a sua gama de operações delicadas como julgar, imaginar, criar valores, é muito mais aperfeiçoado e sutil do que o pensamento consciente associado ao eu e ao intelecto: “A esplêndida coesão dos mais múltiplos seres vivos, o modo como as atividades superiores e inferiores se ajustam e se integram entre si, essa obediência multiforme, não-cega, e menos ainda mecânica, mas crítica, prudente, cuidadosa ou mesmo rebelde – todo esse fenômeno do ‘corpo’ é, do ponto de vista intelectual, tão superior à nossa consciência, ao nosso ‘espírito’, aos nossos modos conscientes de pensar, do sentir e de querer”

    Nietzsche - Sabedoria do corpo
    por Jean Granier

     


    Nietzsche - Sabedoria do corpo

    por Jean Granier

    Partindo da consciência, formas-se uma representação superficial e aberrante da vida psíquica, cai-se vítima da falsa separação entre a alma e o corpo, é-se irresistivelmente atraído para o Idealismo e fascinado pelas miragens da metafísica. Pretende-se, ao menos uma vez, ter os meios de uma interpretação adequada da realidade, não ter nenhuma hesitação: é preciso, afirma Nietzsche, deixar de conceber crédito à consciência e se voltar para o corpo. Pois é o corpo o único que tem condições de nos instruir sobre o valor de nossa personalidade profunda. Colocarmo-nos, para decifrar o mundo, no ponto de vista do corpo: é esta a desconcertante, mas fecunda “Revolução copernicana” que Nietzsche nos sugere, e que, em comparação à célebre Revolução kantiana, substituirá o cogito transcendental (e, aliás, todo cogito garantido pela consciência de si) pela compreensão viva que define a subjetividade corporal. Trata-se, com efeito, de um corpo em que a consciência é uma simples função entre outras, e cuja atividade já é desde sempre, por si mesma, manifestação de uma subjetividade, em outros termos, produção intencional de significações. Assim Nietzsche escolhe falar do corpo como um “Si” (das Selbst) e lhe dar magnitude como “a grande razão”: “O corpo é uma grande razão, uma multidão unânime, um estado de pás e de guerra, um rebanho e seu pastor. Esta pequena razão que dizes ser seu espírito, é meu irmão, é apenas um instrumento de seu corpo, e um pequenino instrumento, um joguete de tua grande razão” (Assim falou Zaratustra). A partir disso já não é um escândalo (exceto para um incondicional guardião de cogito!) atribuir o pensamento ao próprio corpo: “Admite-se aqui”, declara Nietzsche com tranquila segurança, “que todo organismo pensa, que todas as formações orgânicas participam do pensar, do sentir, do querer e por conseguinte, que o cérebro é somente um enorme aparelho de concentração” (Fragmentos sobre a energia e a potência). O dualismo da res cogitans e da res extensa é derrubado por fórmulas deste gênero: “Por toda parte onde vemos ou adivinhamos um movimento no corpo, é preciso concluir que há uma vida invisível e subjetiva ligado a ele” (Vontade e potência I).

    Melhor: é preciso admitir que esse pensamento corporal, inconsciente, com toda a sua gama de operações delicadas como julgar, imaginar, criar valores, é muito mais aperfeiçoado e sutil do que o pensamento consciente associado ao eu e ao intelecto: “A esplêndida coesão dos mais múltiplos seres vivos, o modo como as atividades superiores e inferiores se ajustam e se integram entre si, essa obediência multiforme, não-cega, e menos ainda mecânica, mas crítica, prudente, cuidadosa ou mesmo rebelde – todo esse fenômeno do ‘corpo’ é, do ponto de vista intelectual, tão superior à nossa consciência, ao nosso ‘espírito’, aos nossos modos conscientes de pensar, do sentir e de querer, quanto a álgebra é superior à tabuada” (Vontade de potência I). Não é difícil de convencer disso, desde que se cuide de reinserir a consciência no contexto da vida e do mundo real, ao invés de se hipnotizar pela evidência pontual do cogito. Então revela-se claramente que as intermitências da consciência de si e os grosseiros erros que ela comete, tanto em suas avaliações do mundo exterior quanto em sua representação do corpo, tornariam impossível o desenvolvimento dos organismos, caso o corpo já não assegurasse continuamente a solução dos problemas fundamentais. De modo que o intelecto e, de modo geral, as faculdades do espírito consciente são chamados a intervir apenas ocasionalmente, obedecendo a comandos transmitidos pelo próprio corpo (Vontade de potência I).

    Mas essa própria subjetividade global do corpo é reunião de multidão de subjetividades solidárias entre si, segundo estruturas de hierarquização muito complexas e em constantes mutação, pois aqui, como alhures, a harmonia só pode derivar de uma luta. “Guiamos por esse fio condutor do corpo [...] aprendemos que nossa vida só é possível graças ao jogo combinado de várias inteligências de valor muito desigual, graças, portanto, a uma perpétua troca de obediência e comando sob inumeráveis formas” (Vontade de potência I).

    Cada uma dessas subjetividades orgânicas corresponde ao que captamos, mas apenas por meio da representação mais ou menos aproximada de nossa consciência, como “instintos”. Esses instintos são pulsões investidas de um certo quantum de energia vital e cujo trabalho, realizado nas profundezas de Si corporal, mantém-se oculto à observação consciente: as aptidões de cada personalidade e a determinação do seu destino dependem do vigor desses instintos e da qualidade de seu discernimento. Em decorrência disso, “o gênio reside no instinto, a bondade também. O único ato perfeito é o ato instintivo” (Vontade de potência I). O corolário dessa proposições fundamental dá a chave da decadência: decadente é a personalidade cujos instintos estão debilitados e ser tornaram anárquicos, por falha do sistema regulador que garante a unidade do Si, de modo que ela é obrigado a se apoiar em sua consciência e em sua razão, forjando para si, com a disciplina ascética da Moral, um lastimável sucedâneo da flexível inteligência adaptativa dos instintos. O decadente é o doente do instinto, que tenta compensar sua carências com uma hipertrofia da lógica e da consciência do puro Dever.

    Coleção L&P Pocket, vol. 823 (Nietzsche – por Jean Granier)
    Tema “Sabedoria do corpo” do Capítulo IV, pag 89
    1ª Edição Setembro de 2009


    Ficha Técnica

    • Argumento: desCompanhia de dança
    • Direção: Cintia Napoli
    • Concepção e Dramaturgia: Tuca Pinheiro
    • Assistente de Direção: Juliana Adur
    • Criação e Performance: Juliana Adur, Marina Mello, Peter Abudi e Yiuki Doi
    • Iluminação e operação de luz: Fernando Dourado
    • Trilha sonora: Tuca Pinheiro
    • Operação de som: Cindy Napoli
    • Frigurino: Eduardo Giacomini
    • Paisagem sonora externa: Edith de Camargo
    • Voz em off: Paolla de Andrade Torrilhas
    • Texto criado por: Juliana Adur, Marina Mello, Peter Abudi e Yiuki Doi
    • Assessoria de Imprensa: Fernando Proença
    • Ilustração: L. P. Daniel
    • Comunicação Visual: Maria Baptista
    • Direção de produção: Cindy Napoli

    Sobre a obra

    Este projeto da desCompanhia de dança tem o tempo como questão, numa abordagem na qual a memória surge como um elemento provocador para a construção dramatúrgica do trabalho. Como o passado determina e/ou se relaciona com o presente e com o porvir? Como passado, presente e futuro atravessam o corpo do bailarino? E, ainda, de que maneira é possível tecer temporalidades cênicas que transgridam a noção cronológica de tempo do artista e do espectador? Para Proust, cada vez que rememoramos um fato ou uma situação vivida, perdemos um novo pedaço desta memória. Quanto mais a tentamos capturar, mais a perdemos. Qual é a diferença entre memória e lembrança? E o que dizer das memórias do corpo? Onde ficam guardadas e como são resgatadas?

    Estas são algumas das perguntas que temos interesse em vasculhar e mover através da nossa dança e convidamos o bailarino, coreógrafo e pesquisador Tuca Pinheiro, de Belo Horizonte – Minas Gerais, para nos auxiliar nesta tarefa. Pela primeira vez a companhia investe em uma estrutura de direção compartilhada, que vem de encontro com as nossas necessidades atuais de experimentar novos formatos de pesquisa. Queremos ser provocados por um novo olhar - um olhar que, por estar distanciado do trabalho diário da companhia, possa nos revelar outros ângulos sobre a criação artística em dança e outros possíveis entendimentos relativos ao movimento. Tuca surge então neste projeto como um provocador, ensaiador e colaborador dramatúrgico.

    Objetivamos ainda trabalhar na sensibilização e formação de plateia, tanto através das contrapartidas sociais (quando a formação de plateia acontece de uma maneira mais direta e direcionada) quanto através das apresentações abertas ao público espontâneo, tendo em vista que o acesso ao espetáculo e às contrapartidas sociais será gratuito. Além disso, acreditamos que o tema proposto e a maneira como pretendemos abordá-lo potencializam esse trabalho de sensibilização da plateia por tratarmos de questões inerentes a todos nós, artistas ou não. Queremos, portanto, construir um espaço democrático de experiência estética, onde as questões particulares dos bailarinos possam comunicar-se com os espectadores e gerar neles novas questões e reflexões.

    Esse projeto surge, portanto, da necessidade conjunta dos integrantes da desCompanhia de renovação constante nas suas configurações de trabalho, a fim de alcançar resultados artísticos que, a partir da crença no potencial transformador da arte, fortaleçam o diálogo da dança com a sociedade e que se mantenham conectados com o que se pensa e se produz em dança na atualidade.

    Equipe desCompanhia

    sábado, 29 de março de 2014

    MEMÓRIA DA PELE - A relação harmônica entre a energia yang e ying.

    des,

    Há anos atrás fiz algumas aulas de Nei-Kung, uma arte marcial com influência da cultura tibetana, uma das teorias interessantes desta filosofia é que existem polaridades entre parte anterior e posterior do corpo. A parte anterior é positiva e a posterior é negativa. Também lendo o livro “O Corpo Tem suas Razões – Antiginásticas e consciência de si” da autora Thérèse Bertherat, eu encontrei um trecho que diz que os meridianos posteriores, na medicina chinesa, possui relação com a energia yang (negativo), e que os meridianos da parte frontal possui relação com a energia ying (positivo). O que essas informações ajudariam na minha dança? Parece maluquice, mas contribuiu para clarear da onde vêm alguns dos meus padrões de movimentos. Padrões que foi identificado pelo Tuca Pinheiro e Cintia Napoli que apontavam certa falta de organização, foco e clareza. Para os que não conhecem conceitos taoistas de energia, o yang é a energia ativa, solar e masculina; em contrapartida, a ying é receptiva, lunar e feminina (vale lembrar que estas são explicações simplificadas). Descobri que tenho desequilíbrio em ativar a pele posterior do meu corpo, que tem haver com a energia yang (masculina). Da onde vem isso? Eu consigo lembrar coisas da infância que me marcaram, mas não cabe expor aqui, nem preciso ;) Mas o legal dessa história toda é descobrir que posso reequilibrar as duas polaridades da minha pele. Ando experimentando isso no quotidiano e notei que melhorou o meu alinhamento corporal: meu joelho se sente aliviado e consegui levantar o arco transversal da sola do meu pé :) Compartilho isso, pois no laboratório de criação, tenho me interessado nas marcas do corpo e as qualidades distintas que estas podem me provocar. Utilizar essas marcas signfica para mim atualizar, modificar e criar novas consciências de movimentos.

    Yiuki

    a Dança não tem importância...

    galera me peguei pensando na frase que o Gustavo falou pra Cintia e a Cintia falou pra gente.... e ai me aparece esse vídeo nos olhos, e tento ainda mais responder
    qual é o corpo do trabalho?
    qual o movimento que eu busco da minha memória?

    mover/mexer todos somos capazes.


    fica ai meu vídeo (pensante) de sábado....

    http://www.ideafixa.com/musica-e-contexto/

    sexta-feira, 28 de março de 2014

    o que quero falar da memória.

    Quero começar pelo fascínio que a memória me traz, como é bom poder contar, lembrar e reviver alguns fatos da vida. Porque sempre que busco a memória me vem coisas boas, histórias que me fazem bem?
    A minha memória funciona assim, volto ao lugar, sinto os cheiros e me vem logo as cores e os movimentos da história/memória que quero tratar. É curioso que sempre alguns fatos aumentam ou diminuem a cada contação, depende a empolgação que coloco no momento.

    Parei para pensar e tudo me sai do pensamento, seria a falta de memórias ou uma busca muito intensa por um fato que quero nesse momento?

    Tenho que me acalmar para ver a memória surgir, mansa como uma nascente de rio e é bem assim, quando menos percebo ela é um rio  imenso, navegável em minha frente.

    rio_ perigo, medo, bonito, grande, misterioso (não se sabe o que ele tem no fundo) enganador, inconstante, sujeito sempre a alterações.

                                                                                         PAREI.



    IMPRESSÕES DO ENSAIO DE 13/MARÇO/2014.                                              por Peter Abudi.


    impressões do último ensaio

    Iniciamos com a longa tragetória para sair do chão em “uníssono”. Como encontrar um corpo para o trabalho sem perder as especificidades de cada um?
    Depois começamos a integrar o movimento do outro, agregando novas memórias ao nosso movimento. Na 1ª etapa tive a nítida sensação de continuar o discurso do outro, como no nosso exercício verbal. Cheguei até a me confundir com o Yiuki e a me esquecer do que eu tinha construído sozinha anteriormente. Como se estivesse o tempo todo mentindo. Dançando uma dança que não era minha, mas que também era.
    No 2º momento, pensar em uma palavra: ACÚMULO.
    “Meu corpo acumula todos os passados do mundo”.
    Aí, pensamos em construir sobre essa palavra. Ora me perco no caos das infinitas possibilidades, ora encontro lugares que me interessam. Quais? AQUELES EM QUE ME PERCO NO OUTRO E AQUELES QUE ME TOCAM PESSOALMENTE. O entre é todo o resto. Um universo. Pode ser tudo e também pode não ser absolutamente nada. A quem pode interessar? Meu corpo memória exposto? Uma grande exposição de corpos diluídos no tempo-espaço da memória. Crises …

    'O que o corpo não lembra'


    pesquisando umas coisas encontrei o espetáculo "What the Body Does Not Remember" do grupo belga Ultima Vez, e achei que poderia ser legal compartilhá-lo com vocês. O trabalho, de 1987, foi a estreia do grupo dirigido pelo coreógrafo Wim Vandekeybus. Em 2013 fizeram uma remontagem, que inclusive veio para a Bienal de Dança do Sesc do ano passado. 
    Não consegui encontrar o vídeo inteiro, apenas um pequeno fragmento. E pela descrição do trabalho no site, acho que mesmo o ponto de partida dele foi bem diferente do nosso - não exatamente a memória, mas mais as relações entre atração e repulsa, agressividade, medo, ansiedade. 
    Mas achei interessante compartilhar mesmo assim. Há também um texto interessante do Wim Vandekeybus na página deste trabalho no site da companhia, especialmente a seguinte frase: "Mais quand tout est dit et fait, le corps ne se souvient peut-être de rien et tout est une illusion subtile du manque, ce qui aide à jalonner le jeu ou à l’épuiser" e que eu, no meu atual nível de francês, poderia traduzir como: "Mas quando tudo está dito e feito, talvez o corpo não se lembre de nada e tudo seja uma ilusão sutil de falta, que ajuda a balizar o jogo ou a esgotá-lo". 


    Aí vai o link do vídeo que encontrei, como um pequeno teaser da versão 2013:




    Aqui está o link da página deste trabalho no site da companhia (aonde se pode encontrar mais informações sobre o trabalho e o texto completo [um parágrafo] daonde tirei a frase dali de cima):  http://www.ultimavez.com/fr/productions/what-body-does-not-remember

    E, para finalizar, um texto da Clarice Lima sobre esse trabalho, dentro do projeto 7x7 (um projeto de manifestações crítico-poéticas em torno de trabalhos artísticos escritos por artistas - como uma espécie de feedback poético espontâneo). Apesar dela colocar questões muito pessoais nesse texto de alguma forma, pelo menos para mim, ele redimensiona coisas. E isso me fez pensar em duas questões; uma que é: eu leio o texto dela mas não tive acesso ao trabalho que ela assistiu (que poderíamos chamar de 'o fato'), no entanto, ele acaba criando um sentido para mim independentemente deste fato específico (o espetáculo) e quase uma mem´ria-invenção do trabalho (como se eu criasse um espetáculo a partir das impressões e memórias dela em confronto com o quê isso vai reverberando nas minhas próprias memórias); a segunda: ele cria sentido para mim a partir de outros fatos bastante específicos (suas próprias memórias e o modo como me relaciono com isso que ela escreve), mas de algum jeito apesar dessas especifidades eles me afetam - o que me leva à pergunta: qual o limiar entre o particular e particular-universalizado? 


    Drink no Dancing
    Por Clarice Lima a partir de O que o corpo não lembra, de Wim Vandekeybus
    O corpo lembra que amo dançar, que perco 1 kilo por espetáculo, que faço aula de balé antes de jogar tijolos pro ar, que no meu suor tem muito redbull e relaxante muscular, que me sinto cansada a maior parte do tempo, que tenho espetáculo agendados até 2015, que isso é tudo que eu sempre quis, que não vou operar meu joelho, que na audição tinham 500 bailarinos, que sou ok, que tenho sorte e coragem, que fico constrangida com aplausos no meio do espetáculo, que não consigo parar de roer as unhas, que sou Eslovaca, que tenho 22 anos, que já engordei, emagreci, engordei, emagreci e comecei a fumar, que não trabalho com sedução, que é emocionante dançar em grupo, que mal vejo o meu marido, que dançar dói, que como mais stroopwafel do que deveria, que vivo ilegalmente na Europa, que I forgive but I don’t forget, que não sou coreógrafa, que li Roger Garaudy, que tenho muita energia masculina, que gosto de romance, cinema, drink no dancing,cheese.
    O que o corpo não lembra é que isso foi há 25 anos atrás.
    lá tem também mais informações sobre o 7x7 se alguém se interessar)


    Acho que é isso, por hora. Desculpem se  meu último parágrafo ficou meio confuso. Podemos conversar melhor sobre, se for o caso.

    Beijos!